Nuno Vasco Rodrigues: fotografar para preservar

Poderá a fotografia subaquática funcionar como uma ferramenta na luta pelo futuro do planeta e dos ecossistemas marinhos? Foi à procura de resposta para esta e outras questões que recebemos e descobrimos um pouco mais sobre Nuno Vasco Rodrigues, fotógrafo subaquático português, investigador e autor na área da biologia marinha, cujo trabalho fotográfico não só tem estado no centro das atenções do grande público, como vem sendo reconhecido internacionalmente através de prémios de renome e prestígio internacional.
Transcrição:
1. No início foi... a biologia marinha
2. O biólogo marinho
3. Investigação e mestrado
4. Reserva da Biosfera da UNESCO e biodiversidade
5. Fotografia subaquática: uma ferramenta na investigação
6. Investigador e fotógrafo
7. Neto de peixe sabe nadar!
8. A fotografia: talento natural ou formação?
9. All hands on deck
10. Que fotografia gostarias de poder repetir
11. Uma dica ou conselho para quem está a começar
12. Uma dica ou conselho para... o Nuno de há 22 anos!
13. O prémio mais marcante
14. O primeiro mergulho
15. Sustos!
16. O último e o próximo mergulho
17. O mergulho mais marcante
18. Projetos futuros
19. "Escolhe um trabalho de que gostes e nunca terás de trabalhar"
20. Para um Planeta com Futuro
1. Nuno, tornaste-te conhecido pelo teu extraordinário trabalho como fotógrafo, mas, na realidade, começaste pela biologia marinha, certo?
Na verdade, eu continuo a exercer biologia marinha, como biólogo e investigador. A fotografia surgiu como uma ferramenta que foi usada na biologia. Entretanto, fui-me dedicando cada vez mais à fotografia, mas nunca perdi a minha parte de biólogo e de cientista e continuo a ser um investigador do mar e biologia marinha. Continuo a fazer algum trabalho de investigação, se bem que o meu foco agora é, essencialmente, a fotografia virada para a conservação.
2. Em que área ou áreas te especializaste enquanto biólogo?
Sobretudo peixes: o comportamento, a ecologia, as áreas marinhas protegidas e a importância das áreas marinhas protegidas na conservação do ecossistema em geral e, em particular, das comunidades de peixes. Foi aí, também, que eu desenvolvi a minha dissertação de mestrado.
3. Fala-nos um pouco mais do teu trabalho de mestrado.
O que eu fiz foi, basicamente, comparar a comunidade de peixes que existem na costa de Peniche e nas Berlengas. Fiz a comparação entre uma comunidade de peixes de uma zona costeira e não protegida com uma zona mais oceânica, mais afastada daquilo que é a costa - insular, digamos assim - e com algum grau de proteção. Comparei as duas comunidades em termos de abundância de peixes, de tamanho médio, de quantidade de espécies e de diversidade.
Percebeu-se, claramente, que a abundância de peixes é maior por área na Berlenga. O tamanho médio dos indivíduos é, também, maior e existem mais espécies. Tudo isto daria para um trabalho a seguir, que seria perceber por que é que isto acontece: será somente pelo grau de proteção que existe na Berlenga ou porque estamos a falar de um ambiente mais oceânico que propicia o aparecimento de outras espécies?
4. Acreditas que o estatuto de Reserva da Biosfera da UNESCO contribui para a maior biodiversidade marinha observada na Berlenga?
Essa é a grande questão e aqui eu diria que não se trata da questão da Biosfera, porque a Biosfera, por si só, não é um estatuto que confira proteção às espécies. Do que estamos a falar aqui é, de facto, da Reserva Natural das Berlengas. E isso, sim, é uma questão diferente. Essa, sim, regulamenta uma certa proteção dos ecossistemas e das espécies existentes.
O interessante – e o que é aconselhável fazer neste tipo de trabalhos – é fazer o antes e o depois da criação da Reserva. O problema é que a Reserva Natural das Berlengas foi criada em 1981 e a verdade é que antes disso não há trabalhos suficientemente robustos que possam ser um baseline para que agora possamos comparar e perceber o que é que foi a Reserva antes e depois.
5. Chegaste a usar a fotografia como ferramenta no teu trabalho enquanto investigador...
Eu estava, paralelamente, a fazer o mestrado e a trabalhar no meu primeiro livro, que era, precisamente, o Guia de Espécies Submarinas das Berlengas. E ao mesmo tempo que estudava a comunidade de peixes, tinha uma pequena câmara e ia fazendo umas fotografias, o que, por vezes, era interessante para alguma espécie que eu não conseguia identificar de imediato. Fotografava e quando chegava a casa, com mais calma e pela fotografia, conseguia identificá-lo com maior exatidão. Aí começou um bocadinho o trabalho de fotografia subaquática como uma ferramenta para a identificação das espécies e que depois fui usando cada vez mais, nomeadamente, na publicação do livro das espécies. E pronto, foi o início de tudo.
P: Por falar no Guia das Espécies Submarinas das Berlengas [publicado em 2010], como é que o podemos adquirir? Está esgotado há mais de dez anos!
Sim, esse esgotou logo em 2010 e não vou dizer que saia uma nova edição, porque resolvemos ser um bocadinho mais ambiciosos. A equipa pegou no que já existia e estamos agora a trabalhar num outro livro, que espero que saia no início do próximo ano e que será para Portugal inteiro. Será o mesmo tipo de livro, isto é, engloba foto-identificação e será um guia fotográfico de espécies – e estamos a falar desde as algas, esponjas, moluscos, crustáceos, peixes, mamíferos marinhos: um pouco de tudo – para Portugal inteiro: Portugal Continental, Açores e Madeira. Esse é o plano. É um trabalho que já dura há bastante tempo e espero que no início do próximo ano, finalmente, o consigamos publicar.
Estamos a falar de perto de 800 espécies – o que é muito considerável – que se veem em mergulho. Por exemplo, não vou incluir o peixe-espada ou outras espécies que não se veem em mergulho. É um guia muito dirigido para o mergulho. Não é também um guia de espécies comerciais. É um guia para mergulho e com as fotos, penso que praticamente todas, feitas no habitat natural. Há uma ou outra foto de aquário porque não conseguimos uma boa foto no habitat natural, mas não são fotos na lota ou de peixes mortos – sem desprimor nenhum, atenção. Essas imagens são importantes, também, numa vertente mais comercial e para a pesca. Por vezes, os pescadores conseguem identificar imediatamente um peixe que está morto, enquanto, se for uma imagem dentro de água, têm mais dificuldade, porque [quando morrem] os peixes podem mudar de cor, padrão, forma, etc. Uma coisa não invalida a outra, mas este é particularmente um guia feito com quase cem por cento de fotos dos organismos no habitat natural e daí, também, a dificuldade.
6. Apesar de continuares a trabalhar em investigação, atualmente, o teu tempo é dedicado quase em exclusividade à autoria e à fotografia, certo?
Sim, trabalho essencialmente em fotografia: em tentar contar histórias em função da fotografia. Histórias ligadas ao oceano, em particular e sob, digamos, o “chapéu” da conservação. É o que eu tento fazer. Colaboro com várias publicações e o meu trabalho é procurar histórias que eu ache que sejam interessantes para passar para o grande público, com uma linguagem não científica e mais acessível. Procuro contar uma história e ilustrá-la com fotos que ajudem a contar essa mesma história.
Também vou fazendo algum trabalho de investigação – se bem que quase no tempo livre – e, para além disso, sou técnico de cogestão da Reserva Natural das Berlengas. Trabalho ligado à Câmara Municipal de Peniche e este é o meu trabalho full-time – fazer a ligação entre as várias instituições que constituem a comissão de cogestão [da Reserva Natural das Berlengas]: a Câmara de Peniche, o Instituto de Conservação da Natureza, o IPL... Toda uma comissão que tenta promover e disseminar informação sobre as Berlengas e tenta que as Berlengas sejam, de facto, uma área protegida dentro do que nós achamos que devem ser as áreas protegidas no futuro.
7. Quem ou o que é que te inspirou?
O meu avô materno, principalmente. Ele ia à pesca no fim-de-semana e como nós tínhamos uma ligação muito forte, rapidamente, ainda muito pequeno, comecei a ir com ele à pesca. E foi uma paixão imediata: pelos animais, os peixes, a água... lembro-me que íamos passar o mês de Agosto ao Algarve e passávamos os dois um dia inteiro na baixa-mar à procura de peixes e caranguejos. Eu capturava os peixes e caranguejos e depois fazia uns aquários em casa. Portanto, sim, ele foi a minha principal inspiração e a pessoa que acabou por me transmitir este gosto pela vida natural, em particular pelo mar e pelos peixes.
Curiosamente, o meu avô paterno era fotógrafo e, portanto, acaba por haver aqui uma junção de [influências].
8. A fotografia: talento natural ou formação?
Fiz uma pequena formação de dois dias, já numa fase bastante avançada, em que já eu fazia muita fotografia e já tinha publicado alguns livros, mas sentia que faltava algum conhecimento mais técnico ligado à fotografia, ao material, etc. Essa formação acabou por ser útil, embora não crítica. Portanto, a fotografia já fazia parte de mim e já a usava como uma ferramenta no dia-a-dia. Se calhar, ajudou a perceber um bocadinho mais, mas não, grosso modo, não fiz uma formação específica: foi muito tentativa erro – e muitos erros! E pronto, depois as coisas vão saindo e a verdade é que, desde que comecei a fotografar, até hoje, tem sido uma evolução constante, não necessariamente em termos de qualidade, mas em termos de perceção. O que eu fazia há alguns anos não é tanto o que eu faço hoje: é diferente. Se calhar, comecei por querer fazer fotografias bonitas: hoje não é isso que eu procuro. Quero dizer, fazer fotografias bonitas é sempre interessante, mas esse não é o meu foco, não é isso que me move.
9. A foto “All hands on deck”, premiada em 2021 com o Conservation Picture of the Year pela Ocean Geographic Society, é disso um bom exemplo...
Exatamente! É precisamente isso que eu vou procurando. [Por exemplo,] a questão da poluição: ninguém ignora essa questão, principalmente, a questão dos plásticos, que está muito em voga. Não é recente, mas, para o público em geral, é relativamente recente e, de facto é um dos grandes problemas que enfrentamos atualmente – que o oceano enfrenta –, além de outros.
Aqui e ali, vou pegando em grandes temas e, de vez em quando, surge a oportunidade de captar uma imagem que eu acho que é impactante. Não é necessariamente bonita, mas sim, impactante. E o facto de ser impactante vai permitir-me chamar a atenção das pessoas. As pessoas ficam impactadas com a imagem e quando esse impacto surge, abre-se ali uma pequena janela para transmitir uma mensagem. Portanto, através de uma foto que seja bonita, que seja chocante ou, lá está, impactante, temos ali uma pequena janela em que podemos transmitir uma mensagem. Acho que é isso que eu procuro para poder contar uma história, transmitir uma mensagem e chegar às pessoas em geral, principalmente, àquelas que não estão tão ligadas ao oceano como nós e que às vezes ignoram ou não têm tanto conhecimento dos problemas que existem.
10. Há alguma fotografia que gostarias de poder voltar atrás para tirar novamente?
Ah! Quase todas!
[Risos]
Não direi que seja uma fotografia que eu gostava de fazer outra vez, mas a situação. Determinadas situações em que temos só uma oportunidade e que, hoje, se calhar, teria uma abordagem diferente e conseguiria extrair muito mais, mas na altura, se calhar, eu não pensava assim. Achava que aquela era a abordagem certa, mas, lá está, vamos evoluindo ou mudando a maneira como vemos as imagens e como vemos o potencial dessa imagem. E depois, depende um bocadinho de qual é a conjuntura e também, a nossa perceção atual. Isso pode ir mudando. Se calhar, hoje, havia aquela oportunidade e fazia a foto de uma maneira. Se calhar, daqui a dois anos vou achar que não era assim.
P:Isso é sinal de que evoluíste e cresceste enquanto fotógrafo...
R:Sim. Tudo isto implica, também, um conhecimento grande das questões do mar e do ambiente. Estas questões vão mudando – são mutáveis –, mas, também a nossa própria perceção e a nossa experiência vão-nos fazendo ver as coisas de outra maneira. A nossa vivência vai fazendo com que abordemos os assuntos ou olhemos para determinada coisa em perspetivas diferentes, pontos de vista diferentes, portanto, sim, vai-se evoluindo.
11. Um conselho para quem está a começar e quer ser fotógrafo subaquático
Mergulhem muito antes de começarem a fotografar. Essa é a dica que eu dou sempre. O que eu mais vejo são pessoas que praticamente só tiram o curso de mergulho porque querem começar a fazer fotografia subaquática e depois nem fazem uma coisa nem outra. Não estão suficientemente à vontade no mergulhar e, portanto, nunca vão fazer boas fotografias. O mergulho tem de ser algo completamente automático. Mergulhem. Façam cem, duzentos mergulhos antes de começarem a fazer fotografia. E isto aplica-se à fotografia ou a qualquer trabalho debaixo de água. Estamos a falar de um mundo completamente diferente, a que o nosso corpo não está habituado. E nós próprios também não estamos habituados a todo o material e a toda a logística [que o mergulho envolve]: é tudo diferente. Portanto, é fundamental que [o mergulho] se torne parte de ti [para] te sentires completamente à vontade e só depois, então, [começar a fotografar, a filmar ou outros trabalhos].
É comum vermos pessoas que começam a investir em equipamento e depois até têm equipamento muito bom e até podem ter boas ideias e querem contar histórias, só que, simplesmente, não dominam o mergulho. Não vão fazer boas fotografias porque estão sempre preocupados com a flutuabilidade e outros fatores. E a fotografia é um momento [estala os dedos]: ou estamos prontos ou não estamos! Se nós no mergulho não estamos completamente à vontade, dificilmente vamos conseguir captar aqueles momentos certos porque na altura ou temos ar a mais [no colete] ou estamos junto ao fundo ou não estamos bem na luz: há sempre alguma coisa. Fundamental: mergulhar muito, muita formação e muito tempo dentro de água.
12. E que conselho darias ao Nuno de há 22 anos?
Eh pá, nunca me tinham perguntado isso!
[Risos]
Passar o máximo de tempo possível dentro de água. Aproveitar todos os bocadinhos para estar na água e em diferentes ambientes. Estudar muito: as questões oceanográficas, as questões económicas, os fenómenos oceanográficos e, também, as questões ambientais, porque histórias não faltam. Não faltam histórias para contar e muitas vezes, à porta de casa. Não precisamos de ir para a Polinésia Francesa ou para as Maldivas para fazer fotografias fantásticas e contar histórias fantásticas: há histórias aqui ao lado, aqui em Peniche, aqui na Berlenga, no Algarve, nos Açores, na Madeira... há tanta coisa que existe aqui que é tão importante que as pessoas saibam. Por exemplo, projetos interessantíssimos de ciência que estão a acontecer, só que muitos cientistas ainda têm um problema que é: têm muita dificuldade em comunicar com o grande público. Há aquela linguagem científica, muito para os pares e que não chega ao grande público. Portanto, fazer esta ponte é um bocadinho o que eu me proponho, porque também tenho um background de ciência e continuo o trabalho de ciência. Às vezes, estou em apresentações [científicas] e ao fim de cinco minutos, já estou perdido - e tenho um background científico! Ainda há uma dificuldade muito grande em comunicar ciência e é a isso um bocadinho, também, que eu me proponho: contar histórias de uma maneira que cheguem ao grande público e também para as pessoas perceberem o papel dos cientistas e o que é que os cientistas fazem. Têm um pouco a ideia de que [os cientistas] estão fechados num laboratório, assim, como uma espécie de “ratos de laboratório”, e por vezes beneficiando de fundos comunitários – ou seja, dos nossos impostos – e não percebem como essas verbas acabam por ser importantes para contribuir para melhores condições de vida para todos nós. É algo que ainda é feito de modo pouco fluido, parece-me a mim, e que acho que é importante ser trabalhado.
E claro, quando as pessoas começam a perceber e a conhecer estas questões, acabam por ligar-se emocionalmente e quando se ligam emocionalmente, geralmente querem contribuir. Portanto, estamos a ganhar “guardiões”, neste caso, do mar e contra as grandes ameaças que atualmente enfrenta.
13. De todos os prémios, qual foi o mais marcante até hoje?
Há vários que me deram um gozo especial. O ano passado [2021] tive o prémio de Fotógrafo de Conservação do Ano* pela Ocean Geographic Society. Foi precisamente aquela de lixo a ser tirado do mar nos Açores e eu penso que ganhar um prémio como fotógrafo de conservação, que é muito o meu motto, digamos assim, acabou por ser, se calhar, muito marcante. No entanto, em termos de mediatismo, provavelmente, os últimos das Nações Unidas – foi um segundo e terceiro lugar**. Em termos de mediatismo, não dentro do mundo da fotografia, mas para o público em geral, o prémio pelas Nações Unidas acaba por ter uma projeção maior, uma visibilidade maior.
*Conservation Photographer of the Year
**United Nations World Oceans Day Photo Competition | Segundo lugar na categoria Revitalization e terceiro lugar na categoria Nature Based Solutions & Ocean Discoveries
14. Como foi o teu primeiro mergulho?
Antes do curso cheguei a fazer um batismo quando tinha doze anos, no Porto Santo. Mas eu já andava na água com uns óculos de natação desde os quatro anos. Tinha acabado de aprender a nadar e já andava nas praias do Algarve no meio das rochas – andava com os óculos de natação lá dentro, à procura de tudo e mais alguma coisa! Entretanto, comecei a usar uma máscara de mergulho e mais tarde, comecei com a caça submarina – que era a desculpa para ir para dentro de água! – e de vez em quando, lá trazia assim uns chocos: alimentava a família! [Risos]
Portanto, o à-vontade dentro de água, vem de desde muito cedo e aos doze anos, quando eu tive oportunidade de fazer o primeiro mergulho de garrafa no Porto Santo, epá, foi inacreditável! Porque, de repente, deixou de haver aquele limite de tempo debaixo de água, ou, pelo menos, eu podia estar ali dez minutos debaixo de água a explorar tudo e mais alguma coisa, porque já não era só a questão do mergulho livre, em apneia, em que ia lá abaixo e depois tinha de subir logo. Era, de facto, o poder estar lá em baixo com mais tempo para observar e para poder compreender um bocadinho melhor. Acabou por ser libertador e acabou por ser um fascínio tal, que quis rapidamente tirar o curso. Mais tarde, veio a oportunidade de tirar o curso de mergulho e depois o resto... o resto é história!
15. Já apanhaste algum susto por te distraíres em relação ao ar da garrafa enquanto fotografavas?
Vários!
[Risos]
Perguntam-me muitas vezes se eu já tive algum susto ou se já tive alguma situação de perigo dentro de água. Pensam sempre em algo como tubarões. Nunca! Isso nunca. Os meus maiores sustos foram sempre por limitação de ar. Porque estou a fotografar e [penso] “só mais uma... e só mais uma... e só mais uma... e esta agora é que vai ficar boa...” e de repente, estou a trinta metros e estou com ar no limite!
Sim, já apanhei alguns sustos, portanto, desaconselho toda a gente que não seja minimamente prudente e rigorosa, disciplinada com a gestão do ar e regras básicas de segurança, a meter-se na fotografia [subaquática], porque, de facto, eu já me vi em algumas situações não aconselháveis. [Risos]
As situações em que eu me pus em perigo não foram devidas ao ambiente envolvente – por causa de algum animal ou o que quer que fosse. Isso não. Fui sempre eu, por falta de disciplina, por mais embaraçoso que isto seja.
16. Onde foi o último mergulho e onde vai ser o próximo?
O meu último mergulho terá sido na Madeira, no Caniçal... sim, foi lá. Há uma pradaria marinha no Caniçal, que é uma das poucas pradarias marinhas que existem na Madeira. Sabia que a equipa do MARE da Madeira – portanto, os investigadores – tem feito algum trabalho lá de monitorização, para perceber o estado da pradaria marinha. E eu também tinha muita curiosidade, por isso, fiz um mergulho no ano passado para ir lá ver essa pradaria.
O meu próximo mergulho, à partida, será aqui nas Berlengas.
17. P: E qual o mergulho mais marcante?
R: Não consigo [escolher]: tenho muitos mergulhos marcantes!
P: Se calhar até foi o primeiro, porque acabou por ser o que despoletou tudo...?
R: Se calhar... se calhar acabou por ser um ponto importante de todo o processo.
P: Que desencadeou tudo? Porque, se não fosse bom, se calhar, não terias continuado...
R: Sim, se calhar tinha desistido, como acontece a muita gente que tem uma experiência que, por algum motivo, não é boa e acabam por abandonar [o mergulho].
18. Em termos de futuro: tens algum projeto em mente?
Sim, tenho muitos projetos em mente. Há várias histórias que eu quero contar, mas [naturalmente,] não as posso divulgar neste momento. Agora, no imediato, grande projeto é terminar o livro, como falei há pouco. Porque, de facto, já está há tempo demais [para ser fechado]. E o problema é fechar o livro! Porque eu vou para a água com a ideia de fazer uma determinada foto de uma espécie e aparece uma que é nova e diferente e eu quero incluí-la no livro. E isto tem acontecido com muita frequência... O resto da equipa fica doida “porque temos de fechar isto!” Temos, de facto, de fechar [o livro]. Isto é algo que quase não tem fim: catalogar as espécies todas, mesmo sendo [só] em Portugal. Mas é, também, a parte interessante e fascinante disto: é que estão sempre a aparecer coisas novas e estou sempre a aprender, por mais mergulhos que faça.
19. Ouvimos-te falar e vemos o teu trabalho e ficamos com a sensação de que não trabalhas – de que o teu trabalho é deveras tão extraordinário, que é difícil chamar-lhe trabalho na verdadeira (e maçadora) aceção da palavra...
Depende... depende...[Risos]
Há uma parte muito boa, de facto, e que, normalmente, é o que as pessoas veem. E o que as pessoas veem é, normalmente, a parte boa: as fotos nas redes sociais e os artigos já publicados. Mas há um trabalho por trás que é [duro] – não digo que não gosto de o fazer, mas, por vezes, há partes de que não gosto. E há alturas e tarefas em particular que são trabalho a sério, como toda a gente.
P: Podemos estabelecer um paralelo com o trabalho de investigação científica, em que o público em geral fica com uma ideia algo romântica de um biólogo a fazer trabalho de campo no mar, quando, na realidade, mais tarde existe a componente menos glamorosa de análise de dados?
Acaba por não ser muito diferente. Acaba por haver toda a parte de escrita e de pesquisa. É uma parte que é absolutamente fundamental e é crítica para que o resultado seja bom. Implica uma pesquisa tremenda. É muita coisa e é muito moroso. É preciso muito trabalho de investigação. É preciso, por vezes, acordar muito cedo, deitar muito tarde, passar muito frio, passar muito calor... há alturas em que estou no mar e pergunto-me: “mas porque é que eu me meti nisto?” [Risos] E acho que isso é um pouco comum a todas as profissões e acontece com alguma frequência, até. Mas, quando depois o resultado final sai, percebo por que é que foi isso que eu escolhi e acaba por compensar tudo.
20. Para terminar: há uma preocupação generalizada em relação ao futuro do planeta. Sem politizar, o que dirias a quem tem poder de decisão e ação para mudar as coisas?
O que eu diria é que até agora isto tem sido business as usual e chegou o momento em que temos de perceber que o maior valor que nós temos é a biodiversidade. Portanto, se perdemos a biodiversidade, perdemos tudo o resto. Está, de facto, na altura – [se calhar], já vamos tarde – de salvar o que ainda resta, para nos salvarmos a nós também.
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